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Sementeira

O espetáculo “Sementeira” resulta de uma parceria entre dois grupos do ABC Paulista: o Teatral Rizoma, anteriormente Garagem de Teatro, sediado em Ribeirão Pires, e o Grupo Pontos de Fiandeiras, sediado em Santo André. Tal parceria se estabeleceu no processo de montagem do espetáculo “Ponto Segredo. Primeiros Fios”, quando o Rizoma assumiu a cenografia do espetáculo do grupo Pontos de Fiandeiras.

A idealização e realização de um espetáculo para crianças, que tratasse da memória e da importância das histórias, reuniram novamente os dois coletivos, objetivando também no processo de pesquisa a troca de experiências e de metodologias de trabalho entre os grupos.

Os artistas integrantes dos grupos são oriundos de diferentes instituições de formação na área artística, tais como a ELT – Escola Livre de Teatro, Fundação das Artes de São Caetano do Sul, SP Escola de Teatro, Universidade Anhembi Morumbi, Universidade São Judas Tadeu, UNESP - Universidade Estadual Paulista, UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo e USP – Universidade de São Paulo. Tais formações, com experimentações distintas, fomentaram a participação ativa não apenas no campo da atuação, mas na pesquisa da cenografia, figurinos, musicalidade, dramaturgia, entre outros campos que compõem a estruturação de uma peça teatral.

Como objetos comuns de estudo, a arte narrativa e a memória foram os fios condutores de outros trabalhos e pesquisas tais como os espetáculos Ponto Segredo. Primeiros Fios (Pontos de Fiandeiras, 2013 - premiação ProAc, circulação e difusão de acervos museológicos; premiação no Festival de teatro de Paranavaí, melhor espetáculo; premiação Cooperativa Paulista de Teatro, melhor dramaturgia) e o projeto de Contação de Histórias, Pé de Conto (Pontos de Fiandeiras, 2012 - Circulação Bibliotecas Públicas de São Paulo).

A pesquisa inicial deu-se pela narrativa de histórias pessoais, especificamente do período da infância, a fim de que fossem levantadas questões que povoam o universo infantil, e, consequentemente, as influências que tais acontecimentos ocasionaram na formação do adulto. A escolha pela narrativa apontou um ponto específico de interesse: as formas de contar histórias, a possibilidade de criação de imagens a partir da palavra como uma experiência particular de entendimento – “a história é um acontecimento no instante em que se atualiza dentro de nós”1. Contar e ouvir histórias propicia o contato com imagens internas que configuram experiências e constroem conhecimento, pelo simples uso da imaginação.

O tratamento dessas narrativas pessoais, visando a universalidade dos temas abordados resultou em oito cenas, que tratam das relações que a criança gradativamente estabelece: com a família, os amigos e a escola, até a compreensão da sua existência no mundo. O lugar da imaginação, para onde a criança facilmente se transporta, é o lugar da possibilidade de transcender o tempo e a morte, da afirmação da condição de criador. Nessa perspectiva, o espetáculo abarca, além do público infantil, o público adulto que busca resgatar suas histórias juntamente com os atores narradores, refletindo sobre a necessidade urgente em garantir à infância o seu direito a este espaço do sonho, do impossível, do infinito. 
Os narradores condutores dessa viagem, que buscam replantar a sementeira – árvore das histórias, são figuras que transcendem o tempo e o espaço, transitam nesse campo da imaginação, onde tudo é flexível e potente. Se aceitamos o convite para esta viagem, ressoa em nós a experiência do outro, e reconhecemos que nossas imagens internas é que nos proporcionam significações, registram as compreensões que acumulamos ao longo da trajetória vivida.

Estimular a imaginação através da experiência narrativa torna-se imprescindível, uma vez que as crianças estão submetidas diariamente a uma grande quantidade de imagens, não raro estereotipadas, que conduzem a vivências esvaziadas de sentido, ou seja, incapazes de tornar integrado o conhecimento que possibilita a compreensão de si e do mundo. “A função fabuladora adquire toda a sua extensão pela palavra. É preciso que uma imagem fabulosa seja dita e redita. E a cada repetição é preciso que um rasgo da palavra traga uma novidade. A imagem visual é apenas um instantâneo. A verdadeira fábula é a fábula falada, a fábula falada e não recitada – gritada na verdade do entusiasmo e não declamada. Em suma, a função fabulatória pertence ao reino do poético.”2
 

1 – MACHADO, R. Acordais: fundamentos teórico-poéticos da arte de contar histórias. São Paulo: DCL, 2004.

2 – BACHELARD, G. Fragmentos de uma Poética do Fogo. São Paulo: Brasiliense, 1990.

 

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